22 de abril de 2015

epifanias no parque

Quando olho para o meu filho a caminhar no parque e me vejo a orientá-lo, me ouço a dizer "vamos" mais vezes do que desejo e a impedi-lo de largar a correr relva fora, desviando-se do caminho, não consigo não sentir tristeza. Todos os dias desejo que seja adiado o dia em que o espírito selvagem do Diogo seja ferido, e enquanto isso sou eu quem já o vai domando.
Lá íamos, à volta do lago, ele a fazer pausas para apanhar algo do chão, ou mexer numa planta, ou cumprimentar alguém, ou se agachar e esfregar o chão de terra batida cheio de pedrinhas. Fica com as palmas cinzentas, apanha um grão que lá lhe saltou ao tacto e traz-mo. Deixar que se suje à vontade e meta as mãos na boca são tarefas fáceis, comparadas com conter o apressar quando na verdade não há pressa nenhuma, deixá-lo parar quantas vezes quiser. A minha intenção de o "treinar" no parque para que um dia possa andar no passeio sabendo que a estrada é perigosa até pode ser muito boa, mas o que se torna óbvio para mim é a minha ansiedade quase crónica, a necessidade de controlo, o impulso de o proteger e sobretudo a formatação que sofri ao longo desta minha vida, e que por mais que não queira, teimo em já impor ao meu bebé.

Lá estava ele, agachado, tão pequenino, tão frágil no meio da imensidão do parque. Olhei e contive o "vamos?", vi-o a ele e a um plátano centenário, e o meu bebé era feito do mesmo que tudo o resto. Tinha nele a mesma sabedoria centenária do simplesmente existir no momento presente, de tocar no chão e nas pedrinhas porque o chão e as pedrinhas estão ali, o caminho e o relvado formam uma mesma superfície sem limites, e o ir para casa ou ver os patos não existem ainda. Para ele tudo é possilidades, tudo é permitido até que eu lhe diga que não, tudo é limpo e puro até que eu lhe diga que é sujo, tudo é trepável até que eu o avise que pode cair. Parece que à medida que lhe vou roubando esta visão inocente e animal da energia que gere a Terra, transfiro para ele e preencho esses vazios com os meus medos, as minhas regras, os meus limites e limitações. E parece-me tudo tão cruel e injusto, porque na verdade ele é o meu professor, quando volta a agachar-se sem pressa para apanhar mais uma pedrinha.

2 comentários:

Cristina disse...

Revi-me tanto nestas palavras.

Princezinha disse...

Parece que me vejo a mim!! Beijos grandes do país ao lado....Irlanda!!